ERA UMA VEZ...a nossa História.
Qualquer Estória que se preze tem que começar assim. Claro que, no nosso caso, a narração deveria começar a ser escrita na língua Alemã e não na Portuguesa. Porque é da Alemanha mais intrincada que nós vamos agora tratar. Em boa verdade, para quem conseguiu cá chegar (os sítios recônditos não são fáceis de achar) já deve estar com a garganta arranhada de tanto pronunciar o nome do nosso Café. Em jeito de Boas-vindas, convém retroagir ao momento que esteve na origem disto tudo. Que é como quem diz, o que terá levado um grupo de portugueses a viajar para a Alemanha, munidos de uma mochila com material arqueológico, mapas, documentos e até capacetes com lanternas na cabeça?[
Pois bem, não vou responder já a esta pergunta para não estragar o suspense.
Estes "
Indiana Jones" de trazer por casa, mal desembarcaram em “
Stuttgart” perguntaram imediatamente ao primeiro autóctone onde ficava a Rua do Porsche. Qual Rua da Porsche?? Perguntaram-nos. A
Porschestraße?
Nós olhamos uns para os outros e começamos a rir baixinho. Estes alemães não percebem mesmo nada disto. Nem sequer sabem a diferença entre a Rua
do Porsche e a Rua
da Porsche! Qual
Porschestraße, qual carapuça! A
Porschestraße é para os turistas, nós viemos visitar o primeiro escritório do
Ferdinand Porsche. Muito antes de ser criada a Porsche. Nós viemos ver onde tudo começou. Viemos ao "
ground zero" da Porsche. O local do
Big-bang. Viemos em peregrinação ao local onde foi criado o Universo.
A morada: Kronenstraße.
O NÚMERO DA PORTA: 24. O nome do Edifício: "
Ulrich". Foi aqui que, no dia 1 de Dezembro de 1930, Ferdinand Porsche abriu pela primeira vez as portas ao público. A 25 de Abril do ano seguinte o Registo Mercantil de Estugarda conferiu-lhe dignidade ao nome: "
Porsche Konstruktionsburo fur Motoren-Fahrzeug-Luftfahrzeug und Wasserfahrzeugbau".
A empresa era uma espécie de laboratório do Professor Pardal. A invenção, aplicada a todo o tipo de veículos imaginários, era o pão nosso de cada dia. E tanto fazia que fossem para o ar, para o chão ou para a água. Foi este local mítico que nos propusemos descobrir.
Aceleramos o passo em direcção à
Kronenstraße. De certeza que deve estar tudo impecável, apostamos que íamos encontrar uma imponente placa a dizer “
Foi aqui que tudo começou para Ferdinand Porsche”.

Foto: O carro teste do NSU Type 32 estacionado à porta do N.º 24 da Kronenstrasse. Reparem na placa da porta. No início a Porsche ocupava dois pisos, sendo que o primeiro andar era partilhado com outra empresa: a “
Schmidt & Clemens”.

Foto: No Gabinete de Engenharia de Ferdinand Porsche criaram-se objectos de culto. Da Auto-Union à Volkswagen. Na foto da esquerda, novamente a Kronenstrasse. Na foto do meio, no estirador, vemos o projecto do Type 60. Á direita conseguimos ver um dos primeiros modelos à escala construídos pelo Ferdinand Porsche.[/justify:27ti5dhn]

Foto:
Número 14, número, 16, número 18, número 20...número...22.......
Chegamos. Número 24. Paramos, e levantamos as cabeças em direcção ao céu, que é como quem diz, em direcção ao Edifício "
High Tech" que se erguia à nossa frente. Voltamos a olhar uns para os outros, mas agora entreolhando-nos. Mas que raio....o que é isto? À nossa frente, em vez de uma placa a dizer “
Ferdinand Porsche” encontramos uma que dizia:
BRÄUTIGAM & KRÄMER GMBH & CO.KG. De Porsche, nem sinal. O edifício era ultra moderno e a placa era recente. Pelo menos era a cores, um luxo que nos anos 30 não existia. A BRÄUTIGAM & KRÄMER GMBH & CO.KG, que actualmente ocupa os antigos escritórios da Porsche e mais alguns ao lado é uma espécie de Imobiliária de luxo. Vende imóveis caros por toda a Alemanha. Uma espécie de
Remax para ricos. Claro que, percebendo eles de imobiliária, não foram burros nenhuns ao ocuparem território sagrado. Pelo menos para nós. Para eles, pelos vistos, nem tanto.[/justify:27ti5dhn]

Arriscamos subir. Fomos recebidos por uma
Frauqualquer coisa de nome
Sabine Wehling que, muito gentilmente, nos disse que ali apenas se tratava da compra e venda de propriedades ou imóveis. Passou-nos para a mão um catálogo físico equivalente ao que eles têm online (
http://www.colliers-bk.de/22.1?options[object_type]=7). Dissemos-lhe que não estávamos interessados. Que tínhamos vindo de longe, mas pela
Porsche. Não era nossa intenção adquirir qualquer imóvel. E saímos. Tristes e cabisbaixos. Que diabo, não temos remédio e lá vamos ter mesmo que visitar a
Porschestrasse. Estavamos "quase quase" a transpor a enorme e moderna porta da saída daquelas instalações quando ouvimos a voz esganiçada da
Sabine a dizer: “
E se o imóvel tiver pertencido à Porsche?”
Gelamos os passos. Seguramos a porta. Pertencido à Porsche? Hei lá! Isso já poderá interessar. A nossa curiosidade tinha sido espicaçada. Metemos marcha atrás e fomos ver do que é que se tratava. É que, não é todos os dias que aparecem imóveis da Porsche para venda.
A menina chamou um colega de nome
Klaus, segredou-lhe qualquer coisa em alemão que não conseguimos perceber, e o rapaz, acto contínuo, subiu a um mini escadote, abriu uma pequena portada do alto de um armário e tirou de lá um dossier empoeirado. Desceu a escada, bufou na capa e uma enorme nuvem de poeira entorpeceu-nos a visão. Deu um espirro, virou-se para nós e disse: "
É um café velho, fechado há muitos anos, aqui já á beira". E mostrou-nos esta imagem:
O LEHRENKRAUS CAFÉ
Este café, situava-se a um quarteirão do "
Edifício Ulrich" e era pertença da mãe da
Dorothea Reitz. Esta mulher, que ficou conhecida por “
Dodo” foi a mulher que veio a casar com
Ferry Porsche. Não foi no entanto no
Lehrenkraus café que
Ferry Porsche a conheceu. O facto de o café da mãe de
Dodo estar perto do gabinete que o seu pai abriu foi uma feliz coincidência. É que,
Ferry Porsche, conheceu
Dodo, por casualidade num corredor da
Daimler Benz, alguns anos antes. Vão casar em 1935, 4 anos e meio após a abertura do gabinete da
Kronenstrasse.
A áurea mística do Café e a sua ligação à Porsche não está apenas no facto de ter pertencido à família de
Dodo. O que sucedeu, foi que, certo dia,
Josef Mickl o grande especialista da aerodinámica da Porsche, descobriu que as mesas daquele Café (que tinham uma forma estranhamente larga) funcionavam melhor que os Estiradores do Gabinete da
Kronenstrasse 24.
Ora, rapidamente a notícia se espalhou, e a pouco e pouco começaram a “abancar” no
Lehrenkraus Café Karl Rabe,
Karl Fröhlich,
Josef Kales,
Josef Zahradnik,
Erwin Komenda,
Franz Xaver Reimspiess, e claro, o próprio
Ferdinand Anton Ernst (Ferry). O
Lehrenkraus Café, transformou-se assim numa extensão da “
Porsche Konstruktionsburo”. Era um local, sóbrio, coberto pelo fumo dos cigarros e a cheirar a café e a cerveja. E era o local de escelência onde os Engenheiros do Porsche (e não da Porsche) trabalhavam afincadamente, ao mesmo tempo que desenvolviam animadas tertúlias.
Foto: o interior do Café Lehrenkraus:

Foto: as mesas largas que serviam para estender as folhas dos Projectos:

Foto: Dodo Porsche. O anúncio da sua morte em 1985. Em baixo, as duas primeiras fotografias tipo-passe, são de Dodo ao tempo em que frequentava o Café Lehrenkraus:
A SARDINHADA

[justify:27ti5dhn]Adquirido o café pelos "tugas", restauradas as mesas e arejado o espaço, foi preciso encontrar uma nova referência. Era preciso uma mascote, e apareceu a
SARDINHA.
Apesar de não ser um animal com a estrutura e a imponência do cavalo de Estugarda, esse garanhão de quatro patas e crina tesa, a Sardinha Portuguesa não lhe fica nada a dever. Desde logo porque costuma encher de felicidade um povo inteiro, gastronomicamente falando. Só por este facto, já se justificaria a sua colocação no nosso escudo do Café. Mas não é por isso que ela lá está. A Sardinha foi escolhida porque, por incrível que pareça, teve uma ligação a
Ferdinand Porsche e à sua empresa: a
Porsche.
A história da Sardinha é das coisas mais interessantes da História da Porsche em Portugal. E que ninguém sabe, infelizmente. Foi revelada pelo próprio
Ferry Porsche, como sendo a proposta comercial mais caricata da história da marca. E foi divulgada pelo
Richard von Frankenberg. E reza mais ou menos assim: Mal aparecem os primeiros resultados em
Gmund, quando os primeiros carros começam a ficar prontos,
Ferry Porsche apenas procura vendê-los para os países não beligerantes. A aposta comercial da Porsche foi totalmente racional. O carro não era barato e a estratégia comercial de arranque foi a de nem sequer perder tempo com os países que estavam a erguer-se das cinzas. Os mercados a apostar eram o da
Suíça, o de Portugal, o da Holanda e da Suécia. Foi enviada uma proposta directamente ao Ministério da Indústria. O desafio que foi lançado era o de saber se haveria interesse em comercializar os carros desportivos da Porsche em Portugal. A resposta portuguesa foi genial: "
estamos sim senhor. Só precisamos de saber três coisas. Quantos carros querem para cá mandar. Quanto é que valem esses carros. E se aceitam que se envie o preço correspondente em fornecimento de Sardinhas".
A Porsche ficou fascinada com esta postura tão tipicamente portuguesa de trocar o marisco pelos tremoços. Como é óbvio a proposta portuguesa foi rejeitada, mas a piada nunca foi esquecida pela família Porsche.
Uma história destas não merece ser esquecida. Daí a nossa homenagem á Porsche...através da Sardinha.
O LOGO DO CAFÉ
A Porsche entendeu que o célebre Logótipo do Escudo tinha sido criado através de um esquiço num guardanapo de papel. Claro que o nosso também teria que nascer dessa forma. Primeiro porque nos Cafés só existem mesmo guardanapos de papel. Em segundo lugar, não queríamos fugir á tradição da casa.
Foto: o primeiro estudo feito num guardanapo. Se a Porsche tem...

Foto: nós também temos...

Foto: a primeira representação gráfica:

Foto: alguma da evolução:

Todas estas memórias, do “
CAFÉ” à “
SARDINHA” foram deliberadamente apagadas da História da Porsche. Através do "borrão" gigante que está escondido no sótão da
Werk 1 em
Zuffenhausen. O gabinete da
Kronenstrasse desapareceu e o café foi encerrado. Colocaram-lhe umas tábuas pregadas nas janelas e nas portas, e assim ficou. Fechado, desde décadas sem ver a luz. Lá dentro, é ainda possível encontrar vestígios da passagem dos engenheiros da Porsche. Pequenas folhas amarrotadas com estranhos rabiscos de veículos com rodas e motores com ventoínhas. O Café esteve fechado ininterruptamente durante décadas. Até hoje. Por mero acaso, o destino levou este pequeno grupo de amigos a encontrar um imóvel que os próprios Alemão desconhecem.
Não podíamos contrariar um desígnio superior.
Compramos o café. Descravamos as tábuas e o que apareceu é isto que hoje aqui está á vossa frente.
O Café está de novo a funcionar, para expormos nas mesas largas, os nossos Projectos pessoais que a engenharia da vida nos criou, e também, porque não, para nos animarmos em amenas cavaqueiras – um local de diversão Porsche: a nossa “
Porscheland”.
Este local não é fácil de encontrar. Mesmo para quem usa o “GOOGLE” como GPS virtual, vai sentir alguma dificuldade em cá chegar. Mas no dia em que o conseguir encontrar, vai transpor a porta e vai ver que aqueles que cá estão, são pessoas que vale muito a pena conhecer.